11 de fevereiro de 2013

Às "senhoras da limpeza”. Porque não se deve esquecer ninguém.


Maria, menina Sofia, Lena, D. Piedade, Gina, Maria José, Paula, Gorette, Lucy e, mais recentemente, Emília e Alcione. Houve outras mas destas lembro-me bem.
E a pergunta é? O que terão em comum estes nomes? Pois eu respondo. São os nomes de algumas senhoras que, ao longo dos meus 37 anos, trabalharam em nossa casa. Algumas mais tempo, outras menos. Mas todas, de alguma forma, me marcaram e, por isso, merecem uma história só para elas. Aqui está.

Falemos da Maria. A Maria devia ter uns 40 anos. Tinha um ar meio alucinado e três características maravilhosas. 1º, todos os dias de manhã trazia de sua casa duas carcaças com manteiga “para as meninas”. A 2ª característica não era assim tão simpática: enquanto arrumava a casa bebia o vinho todo que havia na dispensa. E a 3ª, penso eu que ligada à segunda, fazia chichi na pia da cozinha (sim, a nossa casa em Alvalade era antiga e, antes das obras que entretanto fizemos, ainda existiam pias ao lado dos lava-loiças). Claro que, quando a 2ª e a 3ª foram descobertas, tivemos que dispensar a Maria.
Depois vem a menina Sofia. Não era propriamente uma menina, mas como já vinha com esse nome de casa dos meus tios, onde já trabalhava há alguns anos, manteve-o. Ora, a menina Sofia era tipo madame Rottenmeier, da Heidi. Ríspida, dura, intransigente. Comigo e com a mana. Porque com o Pantufa, o nosso cão da altura, era um doce. Gostava mais dele do que de nós. Ah, e obrigava-me a beber sumo de maracujá, que ainda hoje odeio. Claro que quando ela virava as costas por minutos, eu despejava o copo de sumo numa das plantas lá de casa. Note-se que ditas murcharam em pouco tempo.



Agora a Lena. Era uma jovem. Vaidosa. Sempre que podia, enfiava-se no quarto dos meus pais onde passava o tempo a vestir as roupas da minha mãe, pintar-se com a sua maquilhagem e a borrifar-se com os seus perfumes. Eu e a mana víamos aquilo e não achávamos graça nenhuma. Um dia apanhámo-la distraída e, para a castigarmos, decidimos trancar a Lena no quarto. E assim foi. Devíamos ter uns 4 ou 5 anos. Unimos as nossas mãos, ainda pequenas, agarrámos na maçaneta da porta e, com todas as nossas forças…pumba, batemos com aquilo. Falta dizer que aquela porta estava com um problema e, quando fechada desta forma, dificilmente se abria. Foi preciso chamar a D. Susana, a vizinha do andar de cima, quase nossa 2ª avó, para vir salvar a rapariga. E lá veio a velhota, com um afiador de facas, tentar tirar a Lena ali de dentro. E eu e a mana a rirmo-nos num dos cantos da sala. A operação de resgate demorou. A mãe entretanto chegou a casa e deparou-se com aquele belo cenário. Claro que, quando a porta finalmente se abriu, a Lena foi…simpaticamente dispensada. Mas atenção: ia cheirosa. Viemos mais tarde a saber que até o leiteiro pensava que ela era irmã da minha mãe porque, quando lhe abria a porta, estava sempre vestida com as roupas iguais às da sua suposta “mana”.
Entramos na era Piedade. A Piedade era pequenina e usava um coque grisalho no alto da cabeça. Tinha uns 60 anos e cara de bruxa. Mas, coitada, não era má pessoa. Só se transformava quando via na televisão o Torres Couto, na altura secretário-geral da UGT. Quase que o comia. Um dia, antes de sair, estava a Piedade na casa de banho a ajeitar o cabelo e retirou o coque. Nunca a tínhamos visto sem aquilo na cabeça. Tinha o cabelo comprido. Até aos joelhos… Quando me viu a mim e à minha irmã à espreita, olhou para nós com os olhos de bruxa que tinha. A partir daí, ganhámos-lhe um medo de morte. Passado poucos dias, também foi “à vida”.

Veio a Maria José. Uma velhota com 70 anos que se mexia melhor que uma rapariga de 30. A casa arrumada por ela ficava um brinco. Na altura eu já estava de cadeira de rodas mas, como a minha cadeira não entrava na casa de Alvalade, e ela não podia comigo ao colo, a Maria José esticava um cobertor no chão, sentava-me lá, e puxava-me pela casa, até ao sítio onde eu queria ir! Não parava nunca. Só quando caiu em casa dela, partiu uma perna e teve que deixar de trabalhar.

Passemos à Gina. Uma cabo-verdiana com 1m80, gira, gira. Mas estragada pela vida dura que levava. Gostava muito dela. Dava-me uma ajuda enorme. De tal maneira ficámos amigas, que era a única que, a par da minha mãe e irmã, eu deixava que me fizesse o penso a uma escara terrível que tinha feito na zona do coxis. Mas, apanhada em algumas mentiras, tivemos que a dispensar também.

Depois veio a Paula. Baixinha e gordinha, devia ter a minha idade. Era a tal que arrumava a casa a abrir para irmos as duas para a Sul América beber cafés e fumar cigarros. Pegava em mim às cavalitas, descíamos 3 lances de escadas, sentava-me na cadeira que ficava no hall do prédio, e lá íamos nós. Uma companheira. Mas um dia apaixonou-se por um rapaz e decidiu seguir a sua vida.
Da Gorette só me lembro porque era a senhora que trabalhava lá em casa no dia em que eu fiquei de cadeira de rodas. Nesse dia era para vir de manhã mas não conseguiu e ligou a dizer que vinha à tarde. Se tivesse vindo de manhã, talvez eu não tivesse ficado de cadeira de rodas.
Foi durante esta fase que eu e a mana eramos conhecidas como as irmãs metralha. Vá-se lá saber porquê…
Depois largámos Alvalade e fomos viver para a outra margem. Aqui tivemos a Linda, uma cabo-verdiana loira de olhos verdes e cabelo aos caracóis, mas que passados uns anos preferiu regressar à terra. Seguiu-se a Lucy, uma prima dela, boa rapariga, caladona, brutamontes e metódica. Tão metódica que, quando era preciso começar a arrumar a casa por uma divisão diferente, se baralhava toda. Ah, e era exímia em dar-nos cabo de aspiradores. Na era Lucy, que durou quase 7 anos, devemos ter tido uns 4.

Chegamos, por fim, a 2012. E com a saída da Lucy e a morte do Gaspar – que largava pêlo por todo o lado, o que nos obrigava a aspirar a casa diariamente – optámos por contratar uma empresa para, uma vez por semana e em 2 horas, nos dar uma volta à casa. Apareceram-nos 2 irmãs brasileiras – a Emília e a Alcione. Enxutas, bem-dispostas, espertas que nem alhos, rápidas e que não estão ali para brincar. Acabamos por falar sempre um bocadinho, é certo, porque gosto delas, mas em duas horas a casa fica pronta. E num brinco.

E pronto, aqui deixo a minha homenagem a estas senhoras, de quem nunca ninguém fala mas que tanto nos ajudam diariamente. As nossas eram umas mais maradas que as outras, é certo, mas todas com algo em comum que sempre as distinguiu: partilharam e partilham o meu espaço. Fazem parte de importantes pedaços da minha vida. Estiveram lá e ajudaram no que puderam. Sem pensarem duas vezes. É por isso que também merecem estar aqui. É por isso que o meu agradecimento é público e de coração.


1 comentário:

  1. OLÁ QUERIDA.BOA NOITE!NÓS TEMOS MUITO APREÇO POR VOÇÊ E ADMIRAMOS MUITO SUA MANEIRA DE ESTAR NA VIDA!(ERES UN ENCANTO..MERECES LO MEJOR...)Beijinhos

    ResponderEliminar