15 de agosto de 2014

À procura da praia certa? Boa sorte.

Escrevo estas linhas enquanto vejo as pessoas a passarem para a praia. Um dia quente, que devem estar mais de 30 graus. Mas eu estou ao fresco, na nossa varanda. E vocês sabem como eu gosto de varandas.

Este ano alugámos uma casa no Alvor, num pequeno condomínio que fica a 10 minutos a pé daquele mar tão azul que, desde que o descobri, no ano passado, passou a fazer as minhas delícias.

Cá estamos as 4. As de sempre, claro.
Têm sido dias calmos. Acorda-se cedo (sem despertador mas o hábito de quase 11 meses fala mais alto), prepararam-se as sanduíches para a praia, mergulha-se na piscina da parte da tarde e janta-se na vila ou na varanda lá de casa. Pelo meio, passeia-se a pé ou de carro, já que Alvor fica a meio caminho de quase tudo.
Amigos novos. Vizinhos com quem se partilha a relva à beira da piscina. Vizinhos com filhos de idades próximas, que acabam por partilhar os mergulhos, as bombas, os gelados e as gargalhadas. Vizinhos que se tornam amigos e que acabam por fazer parte das nossas férias. Vizinhos com que se trocam nºs de telemóvel e páginas de Facebook no último dia.
Durante estes dias procurámos Praias Acessíveis. Entenda-se por “acessível” uma praia com estacionamento para pessoas com mobilidade reduzida, passadiço até ao bar, que deve ter um wc adaptado, e depois até ao areal. Já aí, meia dúzia de chapéus de sol reservados para quem não pode escolher o espacinho mais simpático da praia. De preferência com um deck de madeira em volta e na 1ª linha. Por perto, deve haver 1 a 2 tiralôs – carrinho azul e amarelo anfíbio que transporta pessoas com mobilidade reduzida até ao mar – e, no mínimo, 2 monitores formados para saberem ajudar as pessoas que precisam, tanto na transferência como a levá-las ao banho.
Há poucas praias com estas condições. E as que existem, ou pelo menos as que conheci, são quase todas ridículas. O Alvor preenche praticamente todos estes requisitos, sendo que este ano apenas falhou no número de monitores. E não é por serem caros porque, segundo percebi, recebem até 160€ para lá estarem das 10 às 18h, com 2 horas de almoço. Vergonhosamente mal pagos, portanto, pela Junta de Freguesia. O que comprova que esta não é, de todo, uma prioridade desta malta.
Bom, experimentámos a Meia Praia.
Tudo começa pelo miserável parque, em piso de terra batida e, com tanto buraco, que torna o estacionamento na superfície da lua brincadeira de meninos.
Depois, os passadiços, que já não seriam de jeito quando colocados pela primeira vez, calcule-se agora, com anos de gente a passar por cima deles e sem qualquer manutenção.
Casa de banho do bar, como tantas vezes, a servir de arrecadação. Aquele “espacinho porreiro” para arrumar o que não cabe em mais lugar nenhum como, no caso, janelas velhas encostadas a uma das paredes. O cheiro, nauseabundo. Um misto de tudo-aquilo-que-se-faz-numa-casa-de-banho, com cheiro a refogado, borrifado com detergente foleiro.
Chichi feito de nariz tapado, acompanhado da 1ª náusea, desço até à praia e paro num dos 2 chapéus com a tabuleta a dizer “reservado para deficientes”. Tenho a 2ª náusea quando leio aquilo mas respiro fundo. Outra náusea quando constato que estes 2 chapéus estão a 300 metros do mar e a 15 dos outros. Ainda procuro nestes últimos a tabuleta a dizer “reservado para eficientes” mas, vá se lá perceber esta coisa das igualdades, não encontro.


10h e os monitores que nos ajudam nas andanças do tiralô, nem vê-los. Aparece finalmente um, magrelas, quase às 11h, com pinta de quem curtiu a noite toda. Pede desculpa e, ainda meio a dormir e com falta de duche, lá vem ajudar. Perto das 11h30/12h chega o colega, igualmente com poucas horas de sono.
Mas espanto foi quando percebemos que nem sequer conheciam a técnica de transferência para me pôr no raio do carrinho. Fica a explicação, para o caso de um dia precisarem: são necessárias 2 pessoas com alguma força de braços. Uma fica atrás e põe os braços por baixo dos meus. Outra à frente, que agarra por baixo dos joelhos. 1, 2, 3, coordenados, levantam e, sem largar, sentam-me no braço do tiralô (uma boia amarela onde se faz a primeira pausa). 1, 2, 3, coordenados novamente, levantam e sentam-me no tiralô. Depois, banho connosco. Alguns de nós saem do carrinho e nadam, outros ficam mais confortáveis no tiralô. Difícil? Não. Apenas alguma técnica, jeito e vontade de fazer bem.
Tomei um banho e vim-me embora da praia. Porque ninguém gosta de estar em locais que não são pensados para nos fazerem sentir bem. Tal como aqueles pais que se recusam a ir para hotéis estúpidos onde não se aceitam crianças, ou aquelas casas que não aceitam os nossos animais de estimação.
Obviamente que esta falta de organização tem consequências: nem um “tusto” gasto naquele espaço. Nem meu, nem dos milhares e milhares de turistas com mobilidade reduzida que todos os anos se deslocam ao Algarve. 

Já agora, deixem-me relembra-los que um dia podem ser vocês, caso partam uma perna no dia anterior a irem de férias, ou tenham sido operados aos joanetes, ou estejam grávidas, ou circulem com carrinhos de bebés. Ou decidam levar a vossa avó à praia. Ou. Ou. Ou. 
Enquanto o mundo não souber a diferença entre integração e inclusão, isto não vai longe. E enquanto for só um grito de meia dúzia de gatos-pingados, pouco ou nada mudará.

3 comentários:

  1. Olá Marta! Já me lembrei de ti várias vezes, nos últimos 15 dias, já que o meu poiso de praia é mesmo ali ao lado de onde mergulhaste no ano passado. Não percebi... Não há monitores de todo em Alvor? :( É realmente uma pena que haja tão pouco respeito pelos que precisam de apoio para chegar ao mar... Espero que aproveites ao máximo as férias e o calor que finalmente chegou (apesar de em Alvor ser difícil escapar ao ventinho da tarde!). Um beijinho grande (gostava que fosse ao vivo, quem sabe nos cruzemos por aí!)!

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Ola Maraffaada! Nos dias em que fui havia apenas 1, o que tornava quase impossível quando há mais do que 1 pessoa a querer ir ao banho. Mesmo assim ele estava de saída para outro trabalho e foi necessário enviar 2 senhores de meia idade e gorduchos para fazerem uns dias no Alvor. Desenrascanço da Junta, mais uma vez, que não leva isto a sério. Uma falta de respeito. Enfim. Mas gostei mto dos meus dias de ALgarve, como sempre. Para o ano prometo voltar! Um beijinho!

      Eliminar
  2. Parabéns pelo que li, parabéns pela forma clara, aberta, saudável e até "divertida" como expões a tua missão, a tua tarefa e os tuas lutas infelizmente contra uma cultura bastante atrasada, a nossa. Um beijinho.
    Gonçalo Borges Dias

    ResponderEliminar